Uma crônica sobre a difícil decisão que temos que tomar para salvar nossas vidas e o nosso país.

Quem aqui já ouviu falar no holocausto? O assassinato em massa de mais de seis milhões de judeus, durante a Segunda Guerra Mundial? Pessoas brutalmente mortas, a grande maioria delas por asfixia nas terríveis câmaras de gás nazistas?

Muitos de nós estudamos isso nos livros de História, que narram as atrocidades cometidas em um dos momentos mais tristes e cruéis de toda a humanidade.

E se eu disser para vocês que milhares de pessoas, mundo afora, simplesmente negam que o holocausto aconteceu? Que o extermínio de milhões de vidas humanas não existiu e que tudo não passa de uma ficção inventada pelos judeus?

Não se sabe como isso surgiu, mas a esse fenômeno, de negar uma realidade como forma de escapar de uma verdade desconfortável, dá-se o nome de negacionismo. Por mais estúpido e mal intencionado que isso possa parecer, todavia, acontece com mais frequência do que se imagina, em diversos momentos da história.

Falando diretamente com vocês, está acontecendo algo muito semelhante no Brasil, nesse momento crítico pelo que estamos passando. Principalmente desde que o nosso Presidente da República resolveu minimizar os riscos que o coronavírus representa para o Brasil.

Eu nunca deixei de falar sobre política. Nunca aceitei ser um “analfabeto político”, mas eu sei exatamente separar esse conceito do de partidarismo. E já desisti, há muito tempo, de perder meu tempo discutindo ideologias que nos são vendidas como a salvação do mundo. Se quer me enojar, tente conversar comigo sobre partidos políticos e ideologias de direita e esquerda.

Mas não posso deixar de dizer como é perigoso esse novo debate entre GRIPEZINHA versus FIM DO MUNDO que se instalou no País, principalmente nas redes sociais. Eu seria muito, mas muito irresponsável se omitisse a minha opinião sobre isso.

Dizem que a morte causada pelo coronavírus é terrível. Sensação de afogamento, insuficiência respiratória, quase uma asfixia. Como nos campos de concentração nazista, principalmente o de Auschwitz, o maior símbolo do holocausto nazista, que alguns negam a sua existência.

Do outro lado, morrer de fome, de inanição, não deve ser muito agradável também. Minhas irmãs e minha madrinha contavam que mamãe quase passou fome para que nós, filhos, não passássemos.

Saber disso, saber de onde viemos, fez nossa família valorizar muito um prato de comida, ainda que hoje, por obra de Deus e muito trabalho, todos tenhamos o que comer e, ainda, podermos compartilhar essa graça de Deus com algumas pessoas, seja através da geração de empregos ou na assistência que damos, na medida do que podemos.

O desemprego, a falta de comida e de coisas básicas para nosso sustento é tão apavorante quanto um vírus mortal, principalmente se olharmos do ângulo de quem já vê suas “latas de comida” se esvaziando.

Eu conheci a expressão “lata de comida” ainda no início da minha vida. Minha família veio do interior de Minas e, naquela época, era hábito estocar comida, talvez pelo medo de que ela faltasse. Eu me lembro de minha mãe fazendo a “compra do mês” e guardando tudo nas latas de comida. E quando elas começavam a abaixar seus níveis, todos ficávamos preocupados, loucos para chegar o próximo salário de professora da minha mãe, para encher as latas mais um pouco.

Se tem algo que eu presenciei, ao longo de 20 anos de profissão como Advogado, foi o sofrimento de milhares de pessoas, que nos procuravam, endividadas, com suas latas de comida vazias. E posso garantir que o meu sofrimento somente não foi maior do que o daqueles que sentiam a privação de quase tudo.

E agora, o que fazer? Enfrentar o vírus e “manter a economia viva” ou ficar em casa e morrer de fome?

Ainda sobre o tema “nazismo”, existe um livro chamado “A Escolha de Sofia”, que, de forma resumida, conta a história de uma mãe judia que teve de escolher qual de seus dois filhos entregaria aos alemães, para que fosse sacrificado. Qual morreria e qual viveria.

Não sei se a situação do Brasil já se encontra nesse nível, de se escolher entre morrer por asfixia, acometido pelo coronavírus, ou de fome, pela iminente falência da economia nacional, que não demora a se aproximar.

Até porque, com o devido respeito, antes de todo esse quadro pandêmico, o Brasil não estava lá essas coisas. Mas isso é conversa para outro momento.

Com mais de 2,4 milhões de seguidores nas redes sociais, dizem que minha opinião é relevante. As centenas de consultas que eu recebo, todos os dias, reforçam essa minha suposta influência, motivo pelo que eu resolvi me posicionar, sem me preocupar se estou desagradando “a” ou “b”.

Desde o dia 17 de março do ano de 2020, eu e minha família estamos em quarentena dentro de nosso apartamento. Sem sair para lado algum, sofrendo todas as agruras e inconvenientes que um sistema de confinamento produz.

Nosso Escritório de Advocacia, que possui sede física de mais de 400 metros quadrados e mais de 40 profissionais, passou, em três dias, para o mundo virtual, estando hoje totalmente em regime de home office – expressão que passou a fazer parte de nosso momento atual.

A minha escolha, então, foi aderir ao isolamento social, a mais científica forma de combate a uma epidemia. Correto?

Sim e não! A solução, a meu ver, reside  no meio termo. 

A todo instante, chegam números sobre casos confirmados e sobre mortes. No Brasil e no mundo. Chegam de tal forma que as pessoas começam a sentir um tipo de anestesia social. Quando os noticiários dizem que morreram menos de 100 pessoas no Brasil, muitas pessoas já começavam a pensar: “Nossa, ainda é pouco. Aqui não vai chegar com tanta força, pois na Itália já são quase 10 mil.”

Este é o momento em que perdemos um pouco do referencial moral que nos separa da psicopatia social.

Cem pessoas são cem famílias em profundo sofrimento. São cem vidas ceifadas, cem histórias interrompidas. Cem mães, cem pais, cem avós, cem pessoas certamente queridas por suas famílias. E tudo isso, sem a menor necessidade.

A pergunta, todavia, continua: e as centenas de milhares que morrerão de fome se a economia continuar parada? Sim, isso é mais do que preocupante, é desesperador!

O meio termo que proponho é, nesse momento, mantermos o maior número possível de pessoas e famílias dentro de suas casas, em completo isolamento social. Sim, temos de ficar em casa, como eu, como minha família, como os funcionários e colaboradores de nossa empresa, e como todos aqueles que possam fazer isso.

Mas, e os demais? E aquelas pessoas que não possuem condições mínimas para a sua subsistência e a de suas famílias?

Para esses irmãos, para os que tiveram suas vidas viradas do avesso da noite para o dia, é hora de o Estado assumir, em parceria com a sociedade civil organizada, para tentar reduzir ao máximo as enormes dificuldades que já batem à porta.

Não um Estado louco, insano, e irresponsável. Eu me refiro a um ESTADO FORTE, robusto, atuante, que una as pessoas, e não as separe.

Que atue em sintonia fina, visando proteger as micro, pequenas e médias empresas, esses heróis silenciosos, que nunca receberam nenhum crédito por serem os maiores geradores de empregos da economia brasileira.

Um Estado que proteja não somente os empregos, mas os desempregados e os desalentados.

Um Estado que coordene os setores bem-intencionados da sociedade, aliviando a carga sobre os que sempre produziram, mas que, agora, precisam de aparelhos respiradores,

como aqueles irmãos que agonizam nas UTI’s, acometidos por esse vírus desgraçado.

Um Estado que tenha colhões para cobrar de bancos e financeiras pelas décadas de exploração das pessoas e empresas, em uma economia que impõe aos cidadãos as mais elevadas taxas de juros do mundo. Um Estado que determine a essas corporações, através de todos os seus Três Poderes, que devolvam um pouco do tanto que já sugaram da energia vital de nossa sociedade.

Um Estado que, infelizmente, parece não existir no Brasil.

Logo, será o fim de todos, correto?

ERRADO!

Nós, da sociedade civil, os maiores afetados pela grave crise, vamos fazer a nossa parte. Paralelamente, vamos cobrar do Estado que faça a dele. E, principalmente, vamos exigir que esse Estado não desrespeite a inteligência de nós, cidadãos, negando o óbvio: existe uma pandemia mundial, caracterizada por um vírus mortal, cruel, que está dizimando vidas no planeta inteiro.

Negar isso, mais do que uma grande burrice, é cometer, por omissão, o crime de genocídio. Como o holocausto, praticado contra milhões de judeus.

Do outro lado, não sejamos hipócritas e demagogos de achar que, pelo fato de alguns de nós estarmos seguramente isolados dentro de nossas casas, milhões de pessoas não correm o risco de não ter o que comer, e morrer de diversas outras formas que a miséria e pobreza absolutas podem causar.

Aconteça o que acontecer, vamos vencer mais esse grande desafio.

Ao contrário dos chamados “profetas do apocalipse”, que sempre apostam no fim do mundo, eu creio no meu Deus, que detém, para Si, o poder de vida e morte sobre as pessoas.

E acredito na força dos povos, mulheres e homens, que querem mais do que sobreviver. Querem vencer e seguir lutando por um mundo melhor.

Aconteça, pois, o que acontecer, nunca mais a humanidade será a mesma. Será muito melhor!

Tenho muito orgulho de ser brasileiro. Um povo corajoso, brioso, criativo e bem-humorado, que não se deixará manipular, nem pelos que tentam negar o óbvio, nem pelos que querem aproveitar os lucros de uma catástrofe econômica.

Todos sabemos que é perigoso sair às ruas. Os que o fazem, não negam a existência e letalidade desse vírus. Lutam para encher suas latas de comida. E ninguém tem o direito de questionar tal direito à sobrevivência.

Por isso vamos, nós, JUNTOS, construir esse Estado forte, ainda que ele não exista, nesse momento. A base, o alicerce de uma sociedade vigorosa, que enfrenta seus desafios com atitude e dignidade, é, e sempre será o POVO.

Vamos, cada um de nós, fazer a nossa parte. Mesmo que ainda não saibamos qual parte nos cabe nesse momento tão confuso. Vamos nos unir em AÇÕES e ORAÇÕES! Posso lhes garantir que, na história de minha vida, essa combinação nunca falhou. E não vai ser agora que isso acontecerá.

Que Deus nos abençoe, a todos, inclusive os que Nele não creem. Essa é, pois, a grande misericórdia divina: a certeza da proteção de um Pai maior, que ama todos os filhos, mas protege a todos, estando sempre de braços abertos para receber aqueles que ainda não O conhecem!

Vamos vencer!

Que Deus nos abençoe a todos!

André Mansur Brandão
Advogado

Belo Horizonte (MG), 28 de março de 2020.

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