O prazo prescricional da indenização por abuso sexual na infância ou adolescência deve ser contado do momento em que a vítima adquire consciência dos danos causados.
A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de forma unânime, decidiu que, no caso de abuso sexual durante a infância ou adolescência, o período em que a ação indenizatória pode ser movida não começa automaticamente quando a vítima alcança a maioridade civil (atualmente aos 18 anos). Em vez disso, o momento em que a vítima adquire total consciência dos danos em sua vida deve ser considerado, aplicando-se a teoria subjetiva da actio nata.
Uma mulher iniciou um processo de danos morais e materiais contra seu padrasto, alegando ter sido vítima de abuso sexual na infância. Ela afirmou que, embora os abusos tenham ocorrido dos 11 aos 14 anos, só aos 34 anos as lembranças desses eventos começaram a causar-lhe crises de pânico e dores no peito, levando-a a buscar ajuda médica. A fim de aliviar seu sofrimento, ela começou a fazer sessões de terapia, onde compreendeu que as crises eram resultado dos abusos sofridos na infância, conforme avaliação da psicóloga.
O Tribunal de primeira instância decidiu que o prazo de prescrição, que é de três anos para esse tipo de ação, deveria iniciar quando a autora alcançasse a maioridade civil. Como a ação foi movida mais de 15 anos após o prazo ter expirado, foi declarada a prescrição, decisão que foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).
O Ministro relator do caso no STJ destacou que, embora os danos íntimos do abuso sexual sejam duradouros, sua manifestação pode variar com o tempo, em resposta a diferentes eventos ou estágios da vida da vítima. Ele apontou que, muitas vezes, a vítima tem dificuldade para lidar com as consequências psicológicas do abuso, podendo levar anos, ou até décadas, para reconhecer e processar plenamente o trauma sofrido.
Diante disso, o Ministro argumentou que não é justo exigir que a vítima de abuso sexual na infância ou adolescência tome uma ação para buscar indenização em um prazo tão curto, após alcançar a maioridade civil. Ele ressaltou que, devido à complexidade do trauma causado pelo abuso, é possível que, ao atingir a maioridade, a vítima ainda não tenha total consciência do dano sofrido nem das consequências que isso poderá ter em sua vida.
“Considerar que o prazo prescricional de reparação civil termina obrigatoriamente três anos após a maioridade não é suficiente para proteger integralmente os direitos da vítima, tornando-se essencial analisar cuidadosamente o contexto específico para determinar o início do lapso prescricional em situações de abuso sexual na infância ou na adolescência”, concluiu o magistrado.
O Ministro enfatizou a importância de conceder à vítima a oportunidade de provar quando percebeu os transtornos decorrentes do abuso sexual, a fim de estabelecer o início da contagem do prazo de prescrição para a reparação civil. Ele destacou que a aplicação da teoria subjetiva da actio nata é especialmente relevante nesses casos, garantindo que as vítimas tenham a oportunidade de buscar justiça, mesmo diante de circunstâncias que inicialmente dificultem o exercício de seus direitos.
Fonte: Jusbrasil
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